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terça-feira, 1 de junho de 2010

UMA CRÔNICA SOBRE A DOR


Passam-se os dias e as horas, e como diria o Raul Seixas: e eu aqui dando milho aos pombos. Bem, não é tanto assim. Fazendo um balanço honesto, até que não estou me saindo tão mal assim com a vida, considerando que já “dobrei o Cabo da Boa Esperança” - já estou novamente pagando meia entrada no cinema, mas não mais por estudante, e sim por idoso! Dá uma certa vergonha, que tem a ver unicamente com os condicionamentos doentios ou hipócritas da sociedade de consumo, nada conosco, os idosos.
Mas e a dor? A dor humana, a dor do mundo, a nossa dor? Uma médica, ontem, me disse que a dor maior é aquela que alguém está sentindo no momento. Nada pior do que essa dor, seja física ou psíquica, ou espiritual. Volta e meia estamos as voltas com esse duro professor. E quando a dor é grave, aguda, terrível, vai ficando meio eterna, e nos desesperamos porque começamos a temer que ela possa nunca mais ir embora. Filosoficamente eu entendo bem o papel da dor, como forma de crescimento e evolução espiritual; o difícil é entender-me enquanto vivencio a dor – mais claramente: perdoar-me por ter sido tão negligente, ou errado, ou obtuso e estúpido por deixar que as coisas chegassem a esse ponto, de maltratar-me assim com tanta e tamanha dor.
Não sei se é porque ultimamente tenho sentido tanta dor, observo muito mais a dor dos outros. Gente, quanta calamidade! Quanto sofrimento. Hoje mesmo as Tvs nos mostram a dupla calamidade, no norte e no sul – desabamentos lá, com soterramento de pessoas e mortes, e pontes que desabam aqui – mais mortes. Se somarmos a isso as calamidades do trânsito brasileiro com a violência que campa – sem entrarmos em detalhes desnecessários – então podemos dizer: é o caos! É muita dor!
Já não dá mais para dizer que é a TV só focando no negativo. É o caos mesmo que bate a nossa porta. E estamos conversados. Tudo estava bem previsto, bem vaticinado, não há novidades para os que são leitores de obras mediúnicas, que pesquisaram na área espírita ou espiritualista. Tudo bem previsto. Tudo bem avisado. Mesmo assim a gente fica pasmo.
Eu já estou somando (ou somatizando) essa dor do mundo com as minhas dores particulares, que são, pelo menos em mim, que as sito, as piores de todas. E aí o tal milagre. Pois mesmo assim eu agradeço. Agradeço pois tudo isso anda me sacudindo suficientemente a ponto de me fazer mudar, mudar para melhor, claro. Deixar de ser tão egoísta, tão orgulhoso e voltar-me um pouco mais para a dor dos outros. Essa é uma nova descoberta para mim. E aí vem-me outra dor, a de pensar que precisei chegar a condição de maturidade para abrir um pouco mais o mão-fechada com tudo que sempre fui.
Enfim, parece que não vai ter mais jeito. A dor agora veio para ficar, permanecer definitivamente comigo. Irá me acompanhar até o derradeiro momento neste mais que transitório corpitcho de carne – futura comida de vermes. Algo assim como essa malfadada prima que chamamos de morte, companheira inevitável dos nossos mais profundos pensares, e que por não ter jeito, acabamos por nos acostumar com ela, mantendo-a numa espécie de prateleira-esquecimento. Pois então, estou construindo mais uma dessas prateleiras, a da dor-esquecimento. Os esotéricos diriam simplesmente que são as prateleiras de transcendências. O milagre de transformar dor em luz, morte em vida e renascimento, sem fantasias ou simples elucubrações literárias, um dia sabe-se que é coisa pra valer, como um ferro em brasa, desses de marcar o gado, que vem e imprime na carne e na alma.

Um comentário:

  1. Querido, tudo isso, a dor, existe, mas também é ilusório, apenas um jeito de olhar. Lembra, os orientais já disseram que sob o céu, tudo é Maia, ilusão. Tem que soltar um certo ponto de vista acabrunhado, em vez de olhar para o que falta, para o que despenca, olhar mais para a Mágica que está acontecendo bem agora. Sei que você sabe disso, enquanto escrevia, esqueceu. Faz parte do movimento de subir as escadas.
    Beijo,
    tua amiga,
    Maria Helena

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